Romaria à Serreta

Utilizando como âncora temporal a segunda semana de Setembro, a exemplo dos “Mistérios Eleusianos” que se realizam na Grécia desde há pelo menos 5.000 anos nesta mesma data, têm lugar na Terceira várias cerimónias religiosas Católicas, de invocação de Nossa Senhora dos Milagres (“Remédios”, “Esperança”, “Saúde”, ou semelhantes), que reúnem um conjunto de elementos aparentemente filiados nesse outro Culto ancestral.


N.Sra. dos Milagres, Serreta
Do grupo de seis diferentes Festas deste período do ano, destaca-se a da Romaria à Serreta, não só pela dimensão que alcançou, movimentando milhares de pessoas, mas principalmente pelo “espírito” que parece animar os seus participantes, o qual se distingue da atitude ortodoxa usual.


Com efeito, por entre várias celebrações desta data, a da Serreta parece ser a que reúne maior número de elementos atribuíveis a motivações exteriores (e antecedentes) à Cristã.


Destes realçam-se: a) as idades dos participantes, que compreendem muitos jovens (geralmente pouco propensos a “sacrifícios” deste género, mas que aqui são muito numerosos; b) a predominância do sexo feminino (na Grécia, esta peregrinação é apenas de mulheres);


c) a animação periférica, que inclui pequenas, mas frequentes, visitas a “tascas” (comum também à Grécia, onde deveria ser ingerida uma determinada bebida alcoólica, ritual);
d) a abundância das ofertas em cera (a abelha é um dos animas representativos de Deméter); e) todas estas celebrações constam de festas que terminam com uma tourada à corda (nos cultos à Mãe de Deus é comum encontrarem-se sobreposições e transferências de atributos, por exemplo, entre Ishtar/Astarte e Cibele, esta última cultuada com touros, nomeadamente na Península Ibérica); f) a existência, em muitas delas, de um bodo de leite, referente às “libações de leite”, próprias do ancestral culto desta divindade.


Almoço da Romaria, na Mata da Serreta (Foto Íris/ Foto Açor)
Este conjunto de elementos evocativos de um património religioso distinto do Cristão parece funcionar alimentado por processos mnésicos ainda pouco conhecidos, mas que aparentemente estarão sustentando algumas das fontes energéticas da cultura. Na Romaria da Serreta, o processo de hibridação de cultos é notório.